Rumo a cidades (mais) sustentáveis
Os centros urbanos concentram mais de metade da população mundial, valor que deverá chegar aos 60% até 2030 e aos 70% até 2050. Os dados da OCDE não deixam margem para dúvidas: as cidades são os grandes motores da economia e do progresso social.
Mas conseguirão as cidades atuais e do futuro ser ecossistemas sustentáveis, com igual foco no progresso económico, ambiental e social?
As “novas” cidades
O desafio é global e passa, desde logo, por encarar as cidades não como espaços fechados sobre si mesmos, mas como parte de uma rede funcional com a região em que se inserem, o meio rural e outras cidades, num regime de complementaridade e interdependência.
É sabido que as cidades cresceram exponencialmente nas últimas décadas e os seus centros encontram-se hoje praticamente desabitados. Este alargamento dos perímetros urbanos, resultante de uma construção tantas vezes desordenada, traduziu-se num consumo desmedido de recursos, prejudicou o potencial ambiental e produtivo do solo, exigindo um custo acrescido no reforço das infraestruturas e equipamentos. O uso do transporte individual nas deslocações de e para o local de trabalho no centro da cidade foi um dos muitos fatores que colocou em causa o equilíbrio ambiental.
A sustentabilidade das cidades implica uma nova abordagem do solo, destacando-se a extinção do conceito de solo urbanizável. Desta forma, deixa de existir uma definição prévia de expansão, um alargamento urbano forçado, se assim lhe podermos chamar. Em vez disso, o planeamento deverá focar-se nas áreas já urbanizadas, promovendo a sua regeneração e a melhoria da qualidade de vida de quem nelas reside.
A responsabilidade de todos e de cada um
As questões ambientais, nomeadamente as alterações climáticas, afetam toda a sociedade: de cidadãos comuns a economias, passando por empresas e governos. Os grandes responsáveis por este fenómeno são os chamados gases de efeito estufa, cujas emissões têm aumentado exponencialmente em grande parte devido ao uso de combustíveis fósseis, como o petróleo e o gás destinados à produção energética e transportes; mas também por culpa da pecuária intensiva e da queima das florestas. É, pois, premente reduzir estas emissões, recorrendo a energias renováveis e fomentando a poupança de energia e a eficiência energética. E esta consciência deve começar desde a idade escolar através da Educação Ambiental, que tem vindo a alertar e a incentivar os mais jovens para o conhecimento do conceito de sustentabilidade, promovendo a reflexão sobre as causas das alterações climáticas e a proteção da biodiversidade, do território e da paisagem.
Ao adotar políticas amigas do ambiente, em interação com outras entidades, o poder local incentiva tanto empresas como os cidadãos comuns a seguir esses exemplos e a ter outra perspetiva da sua qualidade de vida, em que entra em jogo a consciência ambiental. Esta ação das autarquias implica mudanças na gestão dos municípios, em áreas estratégicas como o consumo de água (para limpeza das ruas ou rega dos espaços verdes), o fornecimento de energia elétrica (para iluminação pública) ou a rede de transportes, entre outros.
Sustentabilidade inteligente
Poderá uma cidade amiga do ambiente privilegiar a tecnologia? A resposta é: sem dúvida que sim. Diversos estudos referem as cidades sustentáveis e as cidades inteligentes como conceitos distintos e algumas vezes inconciliáveis, mas na verdade a tendência é cada vez mais falar em cidades sustentáveis inteligentes.
A aposta neste novo conceito passa pela aplicação de tecnologia em áreas estratégicas como a eficiência energética (uso, por exemplo, de LED na iluminação pública e na telemetria de consumos com atuação remota nos equipamentos elétricos), na gestão de resíduos inteligente, na gestão de tráfego (através de ITS - Intelligent Transport Systems, que recorrem a Tecnologias da Informação e Comunicação - TIC, para ajudar a melhorar o fluxo do tráfego e a segurança rodoviária) e até na construção de edifícios mais sustentáveis.
Apesar de cada cidade ser única, importa salientar o papel da IoT (Internet of Things). Definida pela Internet Society como “a extensão da conectividade de rede e capacidade de computação para objetos, dispositivos, sensores e outros artefactos que normalmente não são considerados computadores. Um caso paradigmático do IoT aplicado às cidades é o da Câmara Municipal de Lisboa, responsável pelo maior projeto desta tecnologia na área do ambiente em Portugal. Trata-se de uma rede com 80 pontos de medição, que monitoriza poluentes atmosféricos, ruído, meteorologia e tráfego. Esta informação em tempo real pode ser consultada por qualquer cidadão no portal Lisboa Aberta.
Também com recurso a tecnologia IoT, estão a ser implementados sistemas inteligentes de gestão de rega em espaços verdes de várias cidades nacionais, como Lisboa, Almada e Vila Franca de Xira. A rega ocorre onde e quando necessário, de forma automática, com base num sistema controlado por informação meteorológica e modelos de avaliação de humidade do solo.
Outro bom exemplo de como a tecnologia pode impactar positivamente as cidades são os sistemas integrados de gestão da mobilidade, que assentam em plataformas integradoras de serviços de transporte, infraestruturas e equipamentos, acessíveis através de uma aplicação móvel. Este tipo de sistemas permite incluir serviços de bike parking/sharing, trotinetas ou carregadores.
O papel das empresas
Os poderes públicos podem ser determinantes para a implementação de políticas sustentáveis, mas pouco ou nada será conseguido sem a estreita colaboração do tecido empresarial. Para além de contribuírem para a poupança de energia, otimização de recursos e consequentemente para cidades mais verdes, as empresas só terão a ganhar ao incluírem as preocupações ambientais nas suas agendas. Na verdade, 89% das mil maiores empresas da revista Fortune consideram já a sustentabilidade um fator decisivo para os lucros nos próximos anos.
Empresas que aderiram a medidas sustentáveis obtêm, desde logo, resultados operacionais e económicos tangíveis, como a redução de custos em energia, água e resíduos. A visibilidade aumenta e abrem-se novas possibilidades de negócios. De salientar que existem cada vez mais empresas a limitar os seus fornecedores a outras com a certificação ISO 14001 (sistema de gestão ambiental).
Para além do mais, importa analisar as tendências do mercado atual, que favorecem as empresas com consciência ambiental, sobretudo no pós-COVID-19. De acordo com um estudo do IBM Institute for Business Value, realizado em nove países (incluindo Estados Unidos, China e Reino Unido), em março deste ano, a pandemia aumentou a perceção e o foco dos consumidores na sustentabilidade ambiental. A saber, 71% admitiu que empresas ambientalmente sustentáveis são empregadoras mais atraentes e quase metade revelou que aceitaria um salário mais reduzido para trabalhar em organizações ambientais e socialmente responsáveis. No que toca a compras, 55% defendeu que a sustentabilidade é muito ou extremamente importante na escolha de uma marca.
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